terça-feira, 17 de janeiro de 2012

SONHOS DE PAPEL



Ernani Maller

Éramos deuses sonhadores
Criando anjinhos de papel
Ou marchávamos soldados
Da cabeça de papel

Sorria um eterno sol de ouro
Nos desenhos do papel
Será que hoje ainda navegam
Nossos barquinhos de papel?

Que levavam ilusões
A um futuro de papel
Ou será que naufragaram
Com nossos sonhos de papel?

RESTO DE FÉ



Ernani Maller


O sol raiou
Pouso o olhar no sertão
Ponha a camisa xadrez
E a calça-pai-João

Na moringa tem água
No ”imborná” tem café
No peito aberto pro dia
Apenas um resto de fé

Penso que ainda é tempo
De se plantar nesse chão
Que racha feito bocas mendigas
Implorando uma migalha de pão

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

UMA SEGUNDA MEIA-NOITE


Ernani Maller

João era um seminarista, já havia seis anos que estudava para ser padre, era o que realmente ele queria. Desde sempre foi ligado à igreja católica. Sua mãe, que fora criada em uma escola de freiras, sempre se orgulhou da religiosidade da família, portanto, ela foi a base moral e religiosa do menino João. Desde muito moço João já ajudava nas missas, apesar de uma ou outra travessura, sempre foi um bom garoto. Até que aos treze anos foi mandado para o seminário, para alegria de sua mãe, que não cabia em si de tanto orgulho, ao ver o filho seminarista, e dizia: imaginem, um padre na família.
A vida no seminário era divertida, porém, alguns dos alunos não eram boas companhias, e foi com um desses alunos que João acabou tendo contato com diversas fotos de mulheres nuas e também fotos de cenas pornográficas. Por mais que tentasse, não consegui se desfazer de algumas fotos, que lhe foram presenteadas por Bernardo, um seminarista mais antigo, que tinha fama de fugir do seminário e sair com garotas. João sentia-se pecando, mas as fotos o ajudavam nas noites de solidão.
Certo dia João caminhava por uma praia, quando viu um menino que escrevia algo na areia, João parou e ficou observando aquele menino. O menino olhava para a palma de uma das mãos e logo em seguida escrevia novamente no chão, até que muito curioso com aquilo João perguntou ao menino:_ O que você está fazendo? O menino respondeu _ Estou contando e catalogando todos os grãos de arreia de todas as praias do Planeta Terra. João riu e falou: _ Mais isso é impossível. Então o menino respondeu: _ A única coisa impossível, é alguém esconder algo do meu pai, como aquelas suas fotos, por exemplo. João Sentiu um calafrio percorrer-lhe o corpo, olhou o horizonte, pensando na resposta do menino, quando tornou olhar a criança, ela havia sumido. João, muito confuso, entendeu que Deus havia lhe mandado uma mensagem bastante clara. Então decidiu, assim que retornasse ao seminário daria sumiço àquelas fotos. Continuou a caminhar pela praia, pensando no ocorrido, quando avistou uma senhora, bem velhinha, que estava à toa na praia, porém, quando João passou por ela, a velhinha murmurou: _ Ou some com o material até meia - noite, ou quem some é voçê. Desta vez João ficou apavorado, por que aquela senhora falou aquilo? Será que se referia às fotos? Será de quem era essa mensagem? Já que a primeira, dada pelo garoto, João havia atribuido à Deus, mas essa agora parecia mais do domônio, ou seriam as duas do demônio, e João é que estava sendo um arrogante e prentencioso achando que Deus havia lhe enviado uma mensagem diretamente? Era melhor voltar logo ao seminário e dar fim aquelas fotos, eram as únicas coisas de errado que ele possuia.
Ao chagar no seminário João foi abordado por dois colegas que precisavam tratar alguns assuntos com ele, assim foram para a cela de um deles e lá permaneceram por muitas horas conversando e bebendo do vinho que era utilizado nas missas, que Bernardo havia desviado, quando chegou em seu quarto João percebeu que já passavam da meia-noite. Sim, já eram meia-noite e vinte minutos e nada havia lhe acontecido. Sentiu um grande alívio, olhou as belas fotos que haviam sido motivo de tanta preocupação, depois as guardou e foi dormir em paz, sem perceber que cometia um erro fatal. João não atentou para o fato de o seu relógio estar uma hora adiantado, era horário de verão, portanto, houve uma segunda meia-noite, a meia-noite verdadeira, sua meia-noite derradeira. João nunca mais foi visto.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

O PODER DO SORRISO

Teu sorriso matou a morte em meu coração.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

ESTÃO POR AÍ



Ernani Maller

As dores que eu causei estão por aí
Os corpos que eu amei estão por aí
As magoas que eu não guardei
Os sonhos que não encontrei
Feridas das qual só eu sei estão por aí

Os ventos que levam segredos estão por aí
Canções de ninar nossos medos estão por aí
O dia repleto de azul
Saudades em bando pro sul
Distantes do meu olho nu estão por aí

Os prantos desperdiçados estão por aí
As súplicas dos desesperados estão por aí
Os lábios repletos de sim
Os corpos que esperam por mim
Colombinas sem seus Arlequins estão por aí

sábado, 15 de outubro de 2011

A PALAVRA



Ernani Maller

A palavra é a matéria prima do escritor,
ela é maleável, sujeita-se aos caprichos do criador.
Mas também se impõem,
em sua ampla diversidade de interpretações.
A palavra morre, cai em desuso, mas também ressuscita.
Idiomas se extinguem,
levando consigo não somente palavras, mas formas de pensar.
Palavras que adjetivam o belo, como: a flôr, a borboleta
e principalmente a mulher.
São obrigatóriamente poéticas, assim como o é,
a palavra que da nome à “lembrança triste”,
um previlégio do idioma português: saudade.
Ao contrário da fotografia, que é o que se vê,
a palavra, é o que se imaginar ser,
ela da campo ao pensamento, asas à imaginação.
Na descrição de uma cena, cada leitor,
com suas experiências de vida, imaginará sua própria cena,
isso torna a palavra infinita, sem limites.
Pela palavra passa o conhecimento, a sabedoria, a erudição.
Sem a palavra não seriamos diferentes dos animais.
Ela distingue povos, classes socias,
profissionais liberais, com seus mais variados discursos,
é o poder das palavras, as palavras do poder.
Quantos livros? Quantos poetas? Quantas religiões?
Filosofia, história, tudo baseado na palavra,
que o ser humano manipula, em um inesgotável quebra-cabeça.
Através da palavra, o ser humano vai se forjando, vai se recriando,
portanto, não acredite se alguêm lhe disser:
“palavras são palavras, nada mais do que palavras”.

O MAESTRO CRONENBERG



Ernani Maller

Terminei um show musical em um clube na cidade de Teresópolis, estado do Rio de Janeiro, e tive a sensação de ter feito uma boa apresentação, era uma “Noite de Queijos e Vinhos”, as pessoas faziam questão de vir me cumprimentar e mostrar seus contentamentos com a minha atuação. Um admirador mais entusiasmado me pediu que mostrasse algumas músicas de minha autoria ao piano, o que me prontifiquei a fazer imediatamente. Nos primeiros acordes uma senhora visivelmente embriagada me interrompeu e perguntou:
_ Ele é meu primo.
_ O senhor conhece o maestro Cronenberg?
E eu respondi _ Não conheço não senhora.
E ela com a voz arrastada, própria das pessoas alcoolizadas, disse:
_ Ah! Que legal. _ Eu falei.
Reiniciei a música interrompida, que foi acompanhada com muita animação por um pequeno grupo de pessoas que rodeou o piano, mas assim que terminei a interpretação a mesma senhora perguntou:
_ O senhor conhece o maestro Cronenberg?
Mais uma vez respondi: _ Não, não conheço.
E ela falou:
_ Ele é meu primo.
_ Que bom.
Foi quando o tal admirador entusiasmado perguntou:
_ Você me acompanha em uma canção? E eu disse: _ Tudo bem.
Mal o cidadão começou a cantar sinto alguém me tocar no ombro, quando eu me viro para ver quem era, a mesma pergunta:
_ O senhor conhece o maestro Cronenberg?
Com muita educação e paciência, respondi pela terceira vez:
_ Não, minha senhora, eu não conheço.
_ Ele é meu primo.
_ Que ótimo.
Mostrei mas algumas músicas de minha autoria, outras pessoas também cantaram até que resolvi me despedir, quando do meu lado ouço mais uma vez a indagação:
_ O senhor conhece o maestro Cronenberg?
Desta vez eu falei:
_ Já sei, ele é seu primo.
Abrindo um grande sorriso, ela falou para que todos ouvissem:
_ Viu? Não disse que ele conhecia?